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Amanhã irão as sedas da China, as cutelarias do velho Japão. Assim progressivamente escassearão as subsistências e dentro em breve, absorvidos pela animalidade, ver-nos-emos obrigados a viver na terra como qualquer animal, a ter saúde como qualquer larva, a acreditar na vida como uma patagónia ou um cherokee.

Que o sábio que daqui a dez mil anos estudar a nossa civilização extinta, aplicando-se à época da decadência, possa, lendo estas linhas de um homem amante da Tradição e da Ordem, verificar que nem todos se deixaram ir na maré, que uma voz houve que se erguesse no meio da cobardía da aceitação universal.

 

A rosa de seda

(fábula)

 

Num fabulário ainda por encontrar será um día lida esta fábula:

A uma bordadora dum país longínquo foi encomendado pela sua rainha que bordasse, sobre seda ou cetim, entre fo-lhas, uma rosa branca. Abordadora, como era muitojovem, foi procurar por toda a parte aquela rosa branca perfeitíssima, em cuja semelhança bordasse a sua. Mas sucedia que umas rosas eram menos belas do que lhe convinha, e que outras não eram brancas como deviam ser. Gastou dias sobre dias, chorosas horas, buscando a rosa que imitasse com seda, e, como nos países longínquos nunca deixa de haver pena de morte, ela sabia bem que, pelas leis dos contos como este, não podiam deixar de a matar se ela não bordasse a rosa branca.

Por fim, não tendo melhor remédio, bordou de memória a rosa que lhe haviam exigido. Depois de a bordar foi compará-la com as rosas brancas que existem realmente nas roseiras. Sucedeu que todas as rosas brancas se pareciam exactamente com a rosa que ela bordara, que cada urna delas era exactamente aquela.

Ela levou o trabalho ao palácio e é de supor que casasse com o príncipe.

No fabulário onde vem, esta fábula não traz moralidade. Mesmo porque, na idade de ouro, as fábulas não tinham moralidade nenhuma.

 

Empresa fornecedora de mitos, Ida

 

— Está ali, disse a criada, um sujeito que lhe quer falar.

— Não disse quem era? perguntei.

— Deu este bilhete, disse ela sem salva.

Pequei no bilhete, e o que li nele fez com que me sentasse direito na cadeira, contra todas as tradições que acumulei na minha vida sem decisões.

O bilhete dizia assim predominantemente:

EMPRESA FORNECEDORA DE MITOS, LIMITADA.

E, por baixo, lia-se, a subordinação do costume:

«Representada por…»

— Este sujeito perguntou por mim? inquirí déla.

— Perguntou pelo «senhor»…

— Bem, disse, manda-o entrar…

O cartão não dizia morada, nem, além destas, trazia uma indicação qualquer.

O caixeiro de praça, ou viajante, entrou no meu gabinete com a segurança física que é peculiar da classe. Diferençava-se dos congéneres meus conhecidos em não trazer mala nem sorriso. Cumprimentou-me cerimoniosamente, com um abaixar leve da cabeça. Indiquei-lhe que se sentas-se. Sentou-se, e fitou-me um momento.

— Desejava?.. meio perguntei.

Ele curvou-se levemente para mim, e começou a expor a sua missão numa voz que, sem deixar de ser um pouco monótona, não o era contudo desagradavelmente.

— Antes de lhe explicar, com a devida minúcia, a natureza e qualidades dos artigos que tenho a oferecer, desejava fazer-lhe, se mo permite, uma breve exposição das razões que levaram a casa que represento — primeiro, a fundar-se, segundo, a produzir, com a ciência e o escrúpulo que mostrarei, as qualidades e tipos de artigos em que se especializou industrialmente.

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