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E, depois, é preciso saber se esses conselhos se adaptam ao indivíduo a que se estão dando, e para isso é preciso conhecer-lhe a alma toda, o que nunca se pode dar. E, além disto, ainda há que o modo de dar os conselhos deve ser exactamente o adaptado àquela alma; aconselham às vezes coisas que não se quer que se façam para, combinadas com elementos outros da alma aconselhada, darem o resultado que se quer. Só gente muito ingénua dá conselhos.

O que nós temos por verdade é apenas a mais provável, ou a mais improvável de várias probabilidades. Assim, qualquer indivíduo, por normalmente certo que no assunto se sinta, não pode jurar, com absoluta consciência intelectual, não só de que tal indivíduo do sexo masculino é seu pai, mas também de que tal outro, do sexo feminino, é sua mãe. Para crer que quem é tido por seu pai o é realmente, o mais que ele tem é, não lhe constando que sua mãe tivesse traído o marido, o julgue que não o fez nunca. Para ter certeza, intelectual, de que tal indivíduo é pai de outro era preciso ter assistido ao acto da fundação, ter inspeccionado de perto a fecundidade — de modo a não haver certeza □ — e ainda assim restava a ideia de paternidade metafisicamente considerada para mais embrulhar o assunto. Quanto a um indivíduo não poder afirmar que tal mulher é sua mãe, quem lhe diz que, parido por ela um ente masculino, este não foi substituído por outro parido, pela ama por exemplo, e por hipótese? O mais que se pode dizer é que isto é improvável — ou antes, que é menos provável que a hipótese contrária. Mas certeza certa propriamente não a há.

O que chamamos verdade não o é para certezas, é o que envolve uma improbabilidade menor, uma maior soma de probabilidades. Tanto basta para entreabrir a porta ao suspeitar. E uma porta entreaberta, porque não é uma porta fechada, é uma porta aberta. O suspeitar entra.

A afirmação que o mundo pode bem ser ilógico peca por querer explicar pelo «não ter explicação». Porque não pode o mundo ser ou lógico ou ilógico. E porque não outra coisa ainda que não seja nada?

Três males humanos:

O da acção.

O do pensamento.

O do sentimento — o precisar sentir qualquer coisa ante qualquer coisa.

A dúvida é a certeza de não estar certo.

Sentir talvez afirme de mais.

Trés ilusóes da acção humana:

— a do pensamento — a ilusão de explicar e resolver.

— a do sentimento — a ilusão de valorizar; ante uma coisa,

de ter de sentir qualquer coisa.

— a da vontade — de agir para qualquer coisa.

— só conhecemos as nossas absorções.

Como encontrar um motivo para agir? Um critério para pensar?

A dúvida é a certeza de não estar certo. Sentir talvez afirme de mais.

 

O automóvel ia desaparecendo

 

Eu explico como foi (disse o homem triste que estava com uma cara alegre), eu explico como foi…

Quando tenho um automóvel, limpo-o. Limpo-o por diversas razões: para me divertir, para fazer exercícios, para ele não fícar sujo.

O ano passado comprei um carro muito azul. Também limpava esse carro.

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